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Setor ferroviário: uma tese bicentenária de desenvolvimento econômico



Breve panorama do cenário brasileiro


Desde quando o Brasil ainda era um império nos primórdios do século XIX, já havia planos do estabelecimento de um modal ferroviário como impulsionador do desenvolvimento da economia e sociedade brasileira. Com o passar dos anos, o que ficou foi um sistema de transporte deficitário e com dificuldades em integrar as diversas linhas espalhadas pelo território nacional.


O interesse e a motivação que tínhamos, no passado, para construir diversas vias férreas permanece o mesmo até os dias de hoje. Trata-se de uma locomoção que é capaz de levar quantidades exorbitantes de cargas em longos percursos com um baixo custo e manutenção barata e acessível. Não foi atoa que o governo sempre subsidiou, com políticas públicas, a construção desses trilhos com a finalidade de conectar diversas regiões do país e criar uma unidade de transporte unificada e eficiente.


Com esses incentivos, mas com uma falta de fiscalização, regulação e monitoramento, o resultado foi que tivemos empresas incentivadas construindo trilhos cada um ao seu modo. A consequência foi que cada empresa construiu trilhos em um padrão específico de bitolas (distância entre as duas faces da linha) e não foi possível integralizar todas as linhas devido a essa diferença de largura entre as linhas férreas. A herança dessa época permanece e ainda hoje temos dificuldade de tornar viável a integração para que esse modal possa deslanchar e impulsionar o nosso desenvolvimento econômico.


Por que o modal ferroviário é importante para o Brasil?


Diferente do transporte rodoviário, as ferrovias sempre desempenharam um papel-chave para o escoamento de grandes commodities do país em direção aos portos, para finalmente serem exportados aos seus destinos. Para se ter ideia, em 2022 o Brasil exportou USD 253 bilhões nos nove primeiros meses. Esse volume de exportação é representado em grande parcela por commodities de petróleo, soja e derivados, carnes, ferro e aço.


Porém, atualmente o modal ferroviário quase que está totalmente a serviço do agronegócio. O uso mais intensivo e prolongado dessas vias ocorre para transporte, principalmente, dos grãos que são produzidos no interior do país. Segundo os dados da CONAB e USDA, a produção mundial de soja é da ordem de 337 milhões de toneladas, sendo o Brasil responsável por 37% de toda a produção ao redor do globo. Os grandes responsáveis pela alta produção brasileira de soja são os estados do Mato Grosso e Paraná, que somados representam 57 milhões de toneladas de soja e 46% da produção brasileira.


Dessa produção agrícola do Brasil, a maior parte é escoada para os portos através de caminhões. Estima-se que 70% de toda a produção é direcionada para os portos do sudeste e sul, com grande destaque para o porto de Santos (SP) e Paranaguá (PR). Somente os 30% restante da produção são direcionados para o chamado Arco Norte, que são os portos que se encontram no estado do Pará e Amazonas. Apesar de a distância ser mais curta em direção ao norte, a maior parte segue em direção ao sudeste por questões de logística, como custo de transporte, eventuais perdas no caminho e, principalmente, imprevistos por conta da infraestrutura das rodovias. Entretanto, apesar de esse ser o roteiro tradicional de escoamento das commodities, ainda há uma grande perda de eficiência nesse transporte. Segundo os dados da Abimaq, cerca de 50% da produção de grãos do centro-oeste pode ser perdida até chegar nos portos devido a precariedade e distância para serem colocados dentro das vias marítimas. Ainda que a malha ferroviária no sudeste e sul seja satisfatória para atender as demandas locais, o restante do Brasil ainda sofre de um apagão para que seja atendida a demanda contínua para escoamento da produção agrícolas.


Projeto Ferro-grão


Atualmente, só há uma grande linha ferroviária que liga os grandes produtores de commodities agrícolas do centro-oeste aos portos do sudeste brasileiro. Ainda que o acesso exista, é muito dificultado por conta de seu ponto inicial estar próximo dos limites do estado. Por isso, o governo idealizou um plano de desenvolvimento ferroviário que pudesse escoar esses grandes produtos de uma forma eficaz, diminuindo o gargalo e gastos excessivos que há para se alcançar os grandes portos do sudeste. O projeto foi nomeado de Ferro-grão em homenagem aos grandes produtores que serão favorecidos e contará com 993 km de extensão. A ideia é construir uma via que saia de um ponto estratégico do Mato Grosso, que é o município de Sinop (MT), e se conectará até o município de Mirituba (PA) para o escoamento da soja em direção ao Arco-norte. Assim, teremos uma grande rota de escoamento para portos que poderão se modernizar e desenvolver infraestrutura local e também, simultaneamente, baratear o frete ferroviário para aqueles que estão produzindo as commodities.



O plano da União é que a iniciativa privada assuma o projeto na modalidade de um PPI (Programa de Parceria de Investimentos), permanecendo com a concessão da operação da via por até 69 anos desde o início operacional. As estimativas são de que o transporte anual já seja rentável nos primeiros anos de operações e alcance os 30 milhões de toneladas até 2030. Estudos mais avançados preveem que ao final da concessão o centro-oeste já esteja exportando quase 50 milhões de toneladas ao ano para o norte do país. Muitos investidores e empresas de logística já demonstraram interesse e os produtores têm apetite e demanda suficiente para que o projeto seja implementado. A empresa Rumo S.A. (B3: RAIL3) já demonstrou interesse e que seria interessante acrescentar no portfólio de concessões da empresa para expansão da sua malha no território nacional.


Segundo especialistas consultados, acredita-se que essa nova linha irá diminuir os custos de transporte entre 30% a 40% do valor gasto nos dias de hoje. Além disso, será um grande corredor de escoamento principalmente para a Europa e Ásia devido à proximidade geográfica que os portos do Arco-norte têm com essas regiões.


Os grandes impeditivos para que essa obra comece a ser realizada está no seu alto custo, que hoje está na casa dos BRL 12 Bilhões com uma longa duração de construção e a resistência das populações locais que alegam que serão prejudicados por uma construção que passe próximo as suas habitações. O projeto hoje está parado no STF, para que se defina a legitimidade de uma via de transporte passar por zonas de reserva legal e conservação ambiental, ainda que a via represente apenas 0,0054% da área total.


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