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A economia dos megashows: muito mais que entretenimento



A indústria musical é uma poderosa força impulsionadora da economia global, exercendo impactos significativos em diversos setores. Além de proporcionar entretenimento e expressão artística, o cenário musical desempenha um papel crucial no desenvolvimento econômico, gerando empregos, estimulando o turismo e contribuindo para o crescimento de setores relacionados. Ao longo das décadas, as transformações tecnológicas e as mudanças nos padrões de consumo têm moldado essa indústria, apresentando desafios e oportunidades que reverberam na economia em escala global. Como exemplo, pode-se citar a criação recente de diversas plataformas midiáticas para a transmissão de conteúdo, sonoro ou visual, e a importância destes no mundo atual. Assim, aquilo que era concentrado em rádios e televisões, hoje está presente em diversas plataformas, aumentando a velocidade da transmissão dos conteúdos e facilitando a monetização desse setor.

 

No Brasil, não é diferente. Colocando em foco o setor de eventos, especialmente após a pandemia do coronavírus, nota-se um forte aumento na demanda por shows e espetáculos musicais, de forma que seus efeitos fossem notáveis do ponto de vista social e econômico. Uma comprovação possível disso é que, segundo dados da consultora PwC Brasil, o mercado brasileiro de shows teve um crescimento de 11% em 2023, comparando com 2022, atingindo um patamar de cerca de US$105 milhões.

 

Nos últimos anos, vários eventos musicais de grande escala foram sediados no país, como o Rock In Rio, em 2022, o The Town e muitos shows da cantora Taylor Swift, esses em 2023. Nesse contexto, para compreender de maneira aprofundada como esses gigantescos eventos influenciaram na economia local de onde ocorreram, é necessário entender mais a respeito da origem da indústria musical, no Reino Unido, e sua situação nos dias de hoje, passando pelo desenvolvimento dos eventos nacionais recentes mais relevantes.

 

Reino Unido: o berço da economia musical

 

A indústria musical exerceu e exerce uma influência significativa na economia inglesa, transcendendo seu valor cultural para desempenhar um papel vital em diversos aspectos econômicos. Historicamente, o Reino Unido tem sido um centro global para a música, contribuindo com artistas e gêneros que atraem fãs de todo o mundo. Eventos como o Glastonbury e artistas icônicos, desde os Beatles até músicos contemporâneos, geram receitas substanciais provenientes do turismo cultural - quando pessoas são movidas a um local visando o consumo da música e sua história. Em 2019, o último ano em que foi calculado, essa forma de turismo contribuiu com mais de £4 bilhões para a economia britânica, de acordo com dados do UK Music

 

Além disso, a indústria musical é uma fonte significativa de empregos, abrangendo desde músicos até equipes de suporte, impulsionando a criação de empregos em setores diversos. De acordo com a mesma agência musical, em 2020, a indústria empregou mais de 200.000 pessoas, representando 1 em cada 170 empregos no Reino Unido. Nesse contexto, destaca-se também que as exportações de música britânica são essenciais para a balança comercial, enquanto a evolução tecnológica na produção musical e as mudanças nos modelos de distribuição estimulam o empreendedorismo na indústria. Assim, torna-se evidente que a reputação do Reino Unido como um centro global de cultura pop-rock atrai investimentos e turistas, reafirmando a música como uma força dinâmica que impulsiona o crescimento econômico. Nesse contexto, destaca-se que o impacto econômico da indústria musical não se restringe à cultura de shows e de rua, o que fica evidente pelo aumento constante nas receitas provenientes do streaming. Em 2021, o streaming de música representou 80% das receitas de música gravada no Reino Unido, conforme relatórios da British Phonographic Industry (BPI), o que é pesadamente corroborado pela facilidade de entrega das músicas de forma virtual.

 

Em resumo, a identidade cultural marcada por músicos como The Beatles, Queen, Harry Styles, U2, Dua Lipa, entre outras, não apenas molda a identidade cultural do Reino Unido, mas também desempenha um papel crucial no fortalecimento econômico do país.

 

Essa realidade, apesar de não ser pertencente ao Brasil, é animadora e inspiradora. Além de uma produção musical exuberante, o público brasileiro é extremamente ativo naquilo que tange o consumo de cultura musical: mais de 40% da população possui algum tipo de streaming, de acordo com o IBGE. Dessa forma, essa indústria atua na atividade econômica do país via demanda e via tributação, de royalties e de imposto sobre serviço cobrado conforme o consumo do conteúdo.

 

Nesse cenário, serão descritos os eventos musicais mais importantes do país nos últimos anos, traduzindo a dimensão dos benefícios econômicos ao Brasil associados à indústria de megashows.

 

The Eras Tour: um tour que entrou para a história brasileira

         

Com o início da turnê The Eras, da artista Taylor Swift, vários países foram assolados pelo “Efeito Swift”. Iniciada em 17 de março de 2023, a sequência de shows foi capaz de reanimar o setor de serviços, hospedagens e eventos - praticamente estagnados desde o início da pandemia de covid-19 - de modo que o efeito ganhou até uma citação no relatório econômico do FED, o banco central dos Estados Unidos, devido ao seu grande impacto na economia local. Segundo o relatório, os fãs da artista adicionaram 4,3 bilhões de dólares ao PIB americano durante a turnê.

 

No Brasil, as consequências não foram diferentes. As estimativas de arrecadação foram de 800 milhões de reais pelos seis shows realizados em São Paulo e no Rio de Janeiro durante o mês de novembro, que, apesar de concentrados na região Sudeste, cativaram pessoas de todo o país, levando até a uma maior movimentação na indústria aérea. Todo esse fluxo ocorreu em um período de menos de 10 dias e ainda contou com imprevistos naturais, chuva e calor extremo, que impediram a magnitude real do evento. Apesar disso, graças a essa turnê, também, o lucro da empresa organizadora, a Time For Fun, saltou 93% em comparação com o mesmo período de 2022.

 

O efeito dos shows foi captado efetivamente na Pesquisa Mensal de Serviços (PMS), realizada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) com base em amostras de volume financeiro e de vendas de empresas do Brasil. Os dados, apresentados no gráfico abaixo em índice e variação mensal, mostram uma alta significativa no mês de novembro e dezembro, sendo o último altamente conhecido por ser o melhor mês para a movimentação econômica brasileira. A magnitude desse “Efeito Swift” é visto especialmente na parte de alojamento e alimentação, itens essenciais para aqueles que se locomoveram para assistir ao show e que estiveram acima da média dos outros serviços no mês de novembro, o que raramente ocorre. Destaca-se, por fim, que o efeito demonstrado está considerando o setor de serviços em todo o país, apesar dos shows terem se concentrado em São Paulo e Rio de Janeiro. Assim, os efeitos locais foram ainda mais expressivos.


Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

 

Rock In Rio: a tradição carioca que gera milhões

 

A última edição desse evento bianual brasileiro, organizado pela empresa Rock World, iniciado em 1985, ocorreu em 2022 e terá sua próxima edição em 2024. Entre os dias 2 e 11 de setembro de 2022, milhares de pessoas visitaram a cidade carioca para prestigiar um dos maiores festivais de música do mundo. Artistas e bandas internacionalmente conhecidas, como Iron Maiden, Justin Bieber, Post Malone, Marshmello, e vários nacionais também, por exemplo “Os Racionais MC 's”, Criollo, Emicida e Gilberto Gil fizeram apresentações que contaram com públicos imensos. A partir de tudo isso, segundo dados enviados pela organização do Rock In Rio à Gazeta de São Paulo, o evento como um todo movimentou mais de R$2 bilhões na economia do Rio de Janeiro e teve um público total de 700 mil pessoas, aproximadamente.

 

A popularidade do festival pode ser observada também pelas mais de 80 mil matérias espontâneas e as 450 horas de exibição em TV e rádio, o que ajudou muito na divulgação do evento. A necessidade de atender à demanda da clientela em questão de hospedagem, alimentação, transporte, infraestrutura e logística, acarretou a criação de mais de 28 mil empregos diretos e gerou reverberações no setor de hotelaria da cidade. Tal setor, segundo o Sindicato dos Meios de Hospedagem do Município, foi muito beneficiado pois, na segunda semana do evento, os hotéis da cidade tinham ultrapassado 90% de sua ocupação total.

 

Outro fator interessante de se citar é que a cadeia turística carioca foi muito beneficiada em decorrência do evento, uma vez que cerca de 60% do público vem de fora da cidade, o que faz com que o visitante desfrute de outras atrações do Rio de Janeiro, fomentando o comércio local. Durante o Rock In Rio, os aeroportos também tiveram sua demanda aumentada, com um incremento de 22 mil passageiros nas duas semanas de shows, adicionando voos extras e lucrando com as passagens. Dado o sucesso contínuo desse festival, o qual tem recordes de público batidos a cada edição, a expectativa era que a empresa responsável tivesse novas investidas na indústria musical.

 

The Town: uma nova aposta da Rock World

 

E foi o que aconteceu. O festival The Town ocorreu pela primeira vez no ano passado, em 2023, na cidade de São Paulo, e foi um sucesso absoluto, ficando marcado como o maior festival da história de SP. Artistas como Bruno Mars, Post Malone, Foo Fighters, Maroon 5, Ludmilla, Iza, Luisa Sonza e Pitty se apresentaram no evento, o qual recebeu um público estimado de cem mil pessoas por dia. Entre os dias 2 e 10 de setembro de 2023, a taxa média de ocupação de hotéis em São Paulo foi de quase 100% e, de acordo com um cálculo realizado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), a economia da capital paulista foi impactada em mais de R$1,9 bilhão, em efeitos diretos e indiretos. A maior parte do efeito econômico do evento se deu no setor de transportes - cerca de R$600 milhões -, seguido por compras no comércio local, alimentação e, por fim, hospedagem. O evento gerou 23,4 mil empregos temporários exclusivos e, apenas em tributos, os visitantes geraram gastos de cerca de R$213 milhões. Uma estatística interessante sobre isso é que, a cada R$1 investido no evento, R$6,48 foram movimentados na economia local.

 

Uma parcela substancial do investimento nesse “megaevento” ocorreu devido às marcas patrocinadoras, como Heineken, Itaú, IFood, McDonald's, Sephora, Riachuelo, Colgate, Johnnie Walker, Chilli Beans, TikTok, Spotify, 3 corações e Hellman ́s. Essas empresas geraram ativações durante o festival com o objetivo de engajar o público e melhorar a experiência do evento como um todo.

 

Assim, dado o sucesso em quantidade de visitantes e em receita, a Rock World declarou que haverá novas edições do The Town, intercaladas a cada ano com o Rock In Rio, no Rio de Janeiro. A expectativa é que, cada vez mais, marcas patrocinadoras invistam no evento, como ocorreu com o festival paulista, permitindo um maior orçamento para a empresa organizadora, o que se traduz para artistas muito populares e um público crescente a cada edição.

 

Conclusão

 

A tendência do setor de eventos brasileiro, para 2024, é de crescimento, impulsionado pelo desejo das pessoas de consumirem entretenimento presencialmente no pós-pandemia e pelos mega festivais que acontecerão esse ano: Lollapalooza e Rock In Rio. Para sustentar essa tese, usam-se os estudos da PwC Brasil, de que em 2024 o setor finalmente vai superar o desempenho registrado antes da pandemia, em 2019, de US$108 milhões. Nesse sentido, a taxa de crescimento deve desacelerar para os próximos anos, porém ainda continuará expandindo a uma média anual de 4,4% até o final de 2027 - ano no qual o setor atingirá os US$117 milhões.

 

Assim, fica evidente que, do Reino Unido ao Brasil, a indústria da música e dos eventos a ela atrelados são verdadeiros motores das economias locais, e que a expansão dos megashows pode e deve beneficiar centenas de milhares de pessoas nos próximos anos.

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