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As três visões sobre a corrupção


A corrupção é objeto de estudo no meio acadêmico há muitos anos. Conforme a discussão avançava, o entendimento predominante de suas consequências econômicas foi se transformando. Há três percepções principais que serão abordadas no texto: a visão popular, ainda muito presente, e a visão dos economistas, nos anos 70 e nos dias de hoje.

A primeira delas, a visão popular, é elucidada pela máxima: “rouba mas faz”. Permeia esta frase a relativização da corrupção, contanto que o autor, em geral eleito para algum cargo do poder executivo, efetue investimentos públicos – particularmente investimentos palpáveis como construções. Convém desmistificar essa ideia. Mesmo que a corrupção não afetasse indicadores sociais diretamente, ainda assim eleger indivíduos “que roubam mas fazem” seria prejudicial. Isto porque eles têm incentivos para investir em projetos que facilitam desvios e não nos que proporcionam mais bem-estar para a sociedade. A nomenclatura usada para descrever uma situação em que o sistema de incentivos favorece ações prejudiciais ao bem-estar geral é “distorção alocativa”, exatamente o diagnóstico para esse caso.

Suponha que o agente público desonesto tivesse que escolher entre construir uma ponte ou aumentar o salário dos professores do ensino básico. Seria necessário acordar com todos os professores o pagamento de um porcentual do aumento para que ele pudesse auferir parte desses recursos. Apenas acordar com o responsável da empreiteira que construiria a ponte seria mais viável. Mesmo que a ponte fosse inútil para a região e que o aumento salarial fosse mais valoroso, o agente público escolheria a construção. Os recursos públicos seriam direcionados para projetos onde fossem mais facilmente surrupiados.

A segunda forma de interpretar as implicações econômicas da corrupção é entendê-la como o “óleo que azeita as engrenagens emperradas da burocracia estatal”. Nathaniel Leff e Samuel Huntington foram os principais defensores desta proposta, expressiva nos anos 70. A propina, por exemplo, diminuiria o grau de incerteza, mitigando o risco de descontinuação do projeto; aumentaria a eficiência, agilizando processos burocráticos e seria uma suplementação aos salários dos funcionários públicos, permitindo que o governo mantivesse uma baixa carga tributária em virtude do menor gasto com folhas de pagamento. A corrupção, grosso modo, é tratada como dotada de efeitos econômicos positivos.

Alternativamente, autores como Robert Klitigaard elucidam a visão atualmente predominante. Eles argumentam que a propina é um incentivo para aumentar ainda mais a burocracia, que, por sua vez, gera ainda mais corrupção num processo retroalimentativo. Também são refutadas as ideias de que a corrupção diminuiria o grau de incerteza e funcionaria como suplemento de renda aos funcionários públicos. O pagamento de taxas de urgência (speed money) emperra ainda mais a máquina burocrática e a certeza de conclusão do projeto estaria sujeita a condição de que o agente público em conluio permanecesse no cargo durante todo o período – o que é incerto. Por fim, os salários baixos em áreas de fiscalização e auditoria provocariam queda de arrecadação e, nas outras áreas, ineficiência. Seria necessária então uma carga tributária mais elevada.


Caso tenha se interessado, confira a lista de textos que disponibilizamos para o aprofundamento no assunto. Acompanhe também nossa página, facebook.com/ligademercadofeausp, e fique por dentro de nossas postagens semanais!

CARRARO, André et al. O impacto da corrupção sobre o crescimento econômico do Brasil: aplicação de um modelo de equilíbrio geral para o período 1994-1998. Anais do XXXIV Encontro Nacional de Economia, ANPEC-Associação Nacional dos Centros de Pós-graduação em Economia, 2006.

CAMPOS, Francisco de Assis Oliveira. Três ensaios sobre a economia da corrupção. 2012. 183 f. Tese (doutorado) - Universidade Federal do Ceará, Programa de Pós Graduação em Economia, CAEN, Fortaleza-CE, 2012.

BLANCHET, Luiz Alberto. A transparência na administração pública, o combate à corrupção e os impactos no desenvolvimento. Revista do Direito, Santa Cruz do Sul, v. 1, n. 51, jul. 2017. ISSN 1982- 9957. Disponível em: . Acesso em http://dx.doi.org/10.17058/rdunisc.v1i51.8897.

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