Não surpreende que a teoria dos grandes homens, que prescreve que a história pode ser explicada principalmente pelas ações de indivíduos excepcionais, tenha nascido de um britânico. Desde antes de Elizabeth I a Grã-Bretanha teve a benção – as vezes dúbias – de poder contar com expoentes da humanidade. Figuras como a rainha Vitória, Winston Churchill, Margaret Tatcher e Tony Blair marcaram múltiplas gerações e entraram ainda em vida para os anais da história.
Os britânicos enfrentam agora o maior desafio de seu país em décadas com o Brexit: a reelaboração de mais de quarenta anos de leis, jurisprudências, tratados e práticas, a redefinição de suas fronteiras e a pacificação de um país cujo povo está rachado em dois lados que não se falam. Seria de se esperar que um novo herói, uma Dama ou Duque de Ferro ou um Buldogue.
Ao invés disso, eles terão que se virar com Theresa “Maybe”.
A tarefa que a primeira ministra assumiu em 2016 não era nada fácil. Um governo desmoralizado pela derrota vergonhosa no referendo, pego de surpresa pela situação e subitamente desnorteado. As primeiras notícias sobre ela tampouco ajudaram. Não demorou para que se revelassse que ela própria fora, antes de assumir o cargo, defensora da permanência do reino na EU. Ainda assim, as coisas pareciam poder melhorar. A oposição, tomada de assalto por alas extremistas, estava sob comando de Jeremy Corbyn, ainda mais impopular do que May, e os números das pesquisas indicavam que se novas eleições acontecessem, os Tories, seu partido, conseguiriam uma maioria suficiente para governar a Inglaterra como se não existissem adversários. May, sentindo uma oportunidade, convocou eleições antecipadas.
Uma mistura de trapalhada e arrogância inverteu o cenário. O manifesto de governo dos Tories era intencionalmente pouco detalhado, para que o governo vitorioso tivesse plena liberdade. As poucas propostas concretas foram tão detestadas que o partido teve que voltar atrás. O mundo assistiu incrédulo enquanto as projeções passavam de um ganho de até trinta assentos no parlamento aos poucos se transformaram em uma perda de dois. Se o referendo de 2016 foi uma tragédia, as eleições de 2017 foram sua farsa.
Humilhada, May teve que formar um governo de minoria com o DUP, o principal partido unionista da Irlanda do Norte. A aliança rendeu mais manchetes, dessa vez lembrando a certeza de uma vitória fácil meros meses antes, e os laços dos aliados com o regime do Apartheid na África do Sul.
Uma tentativa de “reiniciar” seu mandato serviu como um perfeito resumo dele. Ao longo do discurso, May teve ataques de tosse que a impediram de concluir suas frases e recebeu um falso P-45, documento que um empregado demitido deve preencher. Depois disso, o letreiro atrás dela literalmente começou a cair.
Nada mudou após o evento. Seu governo continuou surpreendentemente inativo quanto às negociações do Brexit. Quando May tentou reorganizar seu ministério, alguns ministros recusaram-se a sair. Ela não teve forças para movê-los. Os problemas de moradia e saúde pública britânicos continuam a se agravar, sem nenhum plano posto para lidar com eles.
Apesar disso tudo, removê-la não é uma opção para os Tories. As regras internas do partido exigiriam eleições internas nesse caso, e a base partidária defende um Brexit rigoroso. A troca provavelmente poria no poder um populista ainda mais inútil e despreparado do que May.
Theresa Maybe, infelizmente, terá que servir.
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