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O dólar caiu? Não é boa notícia para todos.


Invariavelmente, quando se pensa em câmbio normalmente o vinculam a uma só regra que vale para tudo: de que a valorização do real é boa, pois aumenta o poder de compra do brasileiro, e que a desvalorização mina esse poder. Exemplos de certa forma saudosistas, como quando lembramos da cotação em meados de 1994, quando 82 centavos de real valiam um dólar, são utilizados para criticar a atuação dos governos vigentes ao longo do tempo dado ao fato do dólar ter valorizado muito ante o real. Entretanto, encarar o câmbio de forma dualista é negar que na economia brasileira existem formas de produzir receita e custear a produção completamente diferentes para cada empresa, o que faz a variação câmbio afetar de formas completamente diferentes as empresas. Para uma melhor exemplificação deste fato, podemos comparar duas empresas brasileiras que têm essa divergência de geração de receita e custos de produção: a GOL Linhas Aéreas Inteligentes e a Suzano Papel e Celulose.

Começando pela GOL, vê-se pela Demonstração de Resultado que a grande fonte de receita da empresa é o transporte aéreo com ênfase no transporte de passageiros. Desses voos, cerca de 90% são domésticos, o que mostra que grande parte de sua receita é em reais, ante 10% de voos internacionais, os quais ainda sim não são em sua totalidade recebidos em dólar. Analisando agora os custos da empresa, vemos uma tendência contrária: gastos como combustível para aeronaves, seguros das aeronaves e material de manutenção e reparo representam cerca de metade dos gastos operacionais da empresa e acompanham a alta do dólar, dado a serem produtos e serviços adquiridos em sua maioria de fora, e até mesmo pagos diretamente em dólares. O resultado disso é uma relação inversamente proporcional entre o preço do dólar e o resultado da empresa, sendo extremamente negativo uma alta da moeda americana para a empresa, o que junto com as diminutas margens que o setor de aviação civil tem devido ao seu alto custo fixo em relação ao variável faz com que os lucros e prejuízos do período sejam tão afetados ao ponto que as empresas dos setores preferem fazer massivos hedges para assegurar um câmbio favorável no futuro.

Entretanto, como foi dito antes, nem sempre o dólar alto é preocupante. No caso da Suzano – empresa que tem como principal fonte de receita a produção e venda de papel e celulose – vemos um panorama completamente diferente ao da GOL. Ao mesmo tempo que 70% de suas receitas são advindas de exportações, que são pagas em dólar americano (segundo a própria empresa), seus maiores custos são em reais, o que é relacionado a, por exemplo, suas áreas de plantio de eucalipto serem no próprio país e toda sua produção ser advinda de fábricas no Brasil. Esses dados acabam por demonstrar como a lógica de receita e custo da Suzano é inversa a da GOL, ou seja, tem melhores resultados quando o dólar americano se valoriza e tem piores resultados quando o real ganha força. Para se proteger dessa grande exposição a moeda americana, a Suzano se utiliza de uma forma de hedge natural além do hedge realizado comumente via derivativos, realizando empréstimos e financiamentos indexados ao dólar, os deixando em função do mesmo fator do qual sua receita é majoritariamente composta.

Após tais exemplos, é visível que a valorização e desvalorização da moeda nacional ante ao dólar não é respectivamente positivo e negativo em todos os setores da economia e muito menos em todas as empresas brasileiras. Há setores na economia brasileira que em geral são muito prejudicadas em uma possível alta do dólar, justamente por serem grandes importadores de produtos que são necessários para a continuidade do negócio, que tem sua receita predominantemente no mercado doméstico. Entretanto, também existe o outro lado da moeda, onde setores que são exportadores de produtos e serviços que têm seus custos em moeda nacional sofrem com uma desvalorização da moeda americana, dada a redução de receita que isso gera. Para se proteger desses riscos são utilizadas pelas empresas os hedges, ferramentas que permitem maior previsibilidade a relação custo/receita ao proteger as empresas quanto a variações bruscas do câmbio que afetam negativamente os negócios. Assim sendo, quando vir pessoas otimistas quanto ao cenário do mercado devido a desvalorização do dólar, fique atento, pois o que é bom pra uns não é necessariamente bom para outros.



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