Diante da ameaça de uma nova epidemia, os sentimentos de medo e incerteza ecoam mundo afora. O presidente chinês, Xi Jinping, admitiu que o país vive sua maior crise sanitária desde 1949. Até o momento em que esse artigo foi escrito, o surto de Coronavírus contaminou mais de 79 mil pessoas e cessou a vida de cerca de 3% dos infectados. Entretanto, o COVID-19 (nome oficial) não é apenas um risco à saúde pública, mas também à economia global. Os impactos da doença nas bolsas ao redor do mundo se alastraram tão rápido quanto o seu contágio, causando prejuízos bilionários ao mercado financeiro.
O receio do mercado envolve a diminuição do consumo e da produtividade na China por causa da disseminação do Coronavírus. Por uma questão de segurança, as pessoas não estão indo trabalhar, o comércio local e a indústria estão temporariamente fechados. A Disney, por exemplo, fechou seus parques em Xangai e Hong Kong. Grandes redes como McDonald’s, KFC e Pizza Hut suspenderam suas operações em diversas cidades chinesas. A Starbucks fechou quase metade de suas lojas no país e outras diversas empresas deram férias coletivas até que a epidemia se estabilize. Entretanto, não só na China, mas também em vários outros países, foi decretado o fechamento de fronteiras, o toque de recolher e a suspensão de atividades e eventos em lugares públicos.
A paralisação obrigatória das fábricas chinesas levou a uma escassez de produtos manufaturados e bens de base os quais eram exportados e abasteciam diversas indústrias ao redor do mundo. Até mesmo a Apple já divulgou uma nota na qual estima uma redução de lucro no primeiro trimestre devido à falta de componentes eletrônicos utilizados na produção de iPhones. A empresa americana perdeu cerca de US$45 bilhões em valor de mercado após esse ocorrido. Segundo uma pesquisa da Canalys, tanto a Apple, quanto sua rival Huawei, possuem cerca de 99% da sua produção terceirizada na China, ou seja, nos próximos meses, muito provavelmente, haverá uma contração generalizada na receita do mercado de smartphones.
Segundo analistas, o surto de Coronavírus afeta principalmente as commodities - em especial petróleo, minério, celulose e carne - e os setores de transporte, turismo, varejo, manufaturados, serviços e automóveis. Os impactos dessa mazela são evidentes no comércio mundial. No dia 26 de fevereiro, os contratos futuros de petróleo nos EUA caíram 0,7%, para US$ 49,56 por barril, enquanto o Brent - índice de referência global - caiu 1,3%, para US$54,13 por barril. Entre os primeiros dois meses do ano, o preço do ferro sofreu uma queda de 5%. Além disso, segundo a Autoridade Internacional de Transporte Aéreo, o impacto sobre a demanda por voos pode trazer um prejuízo de US$ 29 bilhões às companhias aéreas. Esse setor e o de turismo são duramente afetados com o fechamento de aeroportos, restrições de fronteiras e cancelamento de voos. Em relação ao varejo, além da estagnação dos comércios locais, é interessante pontuar que os chineses representam 33% dos
gastos globais na categoria de moda de luxo. Ou seja, muito provavelmente grupos como Kering (Gucci, Yves Saint Laurent) e LVMH (Dior, Louis Vuitton) sentirão os impactos da epidemia em suas receitas nos próximos trimestres. Vale destacar, também, que a cidade de Wuhan - epicentro do Coronavírus - é um centro industrial que recebe investimento de 230 das 500 maiores empresas globais e concentra dez fábricas de automóveis, entre elas da Honda, GM e Nissan. Portanto, se a quarentena da cidade se prolongar, poderemos esperar perdas profundas na produção industrial chinesa.
Somente em janeiro, especificamente entre o dia 20 e 27, bolsas de valores mundo afora perderam, ao todo, 1,5 trilhões de dólares em reboque das notícias que envolvem o Coronavírus. O índice de volatilidade VIX, conhecido como o "índice do medo" de Wall Street atingiu altas de até 46% nos pregões do mês. Em decorrência dos casos de infecção fora da China, no dia 24 de fevereiro, as ações globais tiveram a maior baixa histórica dos últimos dois anos. Na Europa, o Stoxx 600 - índice que capitaliza 18 países do continente - caiu 3,8%, enquanto o FTSE 100 do Reino Unido caiu 3,3%. O MIB da Itália caiu 5,4% em sua maior baixa desde 2016. E isso se seguiu a fortes quedas na Ásia, onde o índice Kospi de Seul caiu 3,9%, seu pior dia desde o final de 2018. Em reflexo a esse cenário tão incerto, o preço do ouro subiu 1%, evidenciando, portanto, a busca dos investidores por ativos mais seguros.
Nesse contexto, o Brasil também sente os sintomas do Coronavírus. Em janeiro, o dólar teve valorização de mais de 5% sobre o real, o que fez a moeda brasileira ter o pior resultado em um início de ano desde 2010. No dia 26 de fevereiro, um dia após a confirmação do primeiro caso da doença no país, o Ibovespa sofreu uma queda diária de 7%, a maior baixa desde o fatídico “Joesley Day". Segundo analistas, essa contração foi “puxada"; pelos papéis da Petrobras, Vale, Gerdau, Usiminas e CNS os quais despencaram entre 9,5% e 12%. Além disso, as principais baixas percentuais foram as das companhias do setor de turismo, a Gol fechou com perdas de 14,31%, Azul em baixa de 13,30% e CVC em queda de 11,33%.
Há quem faça previsões otimistas tendo como base o histórico dos impactos da Sars em 2003. Na época, essa doença viral também afetou a economia chinesa e culminou em uma perda de 1,1 ponto percentual em seu crescimento. Entretanto, o país se recuperou rapidamente e, no mesmo ano, o PIB atingiu o patamar de 10%. Apesar disso, é importante salientar que os "tempos mudaram” e o ritmo de expansão chinês não é mais tão robusto, portanto, dessa vez os impactos econômicos serão ainda maiores. Antes do agravamento da epidemia, o FMI projetou um crescimento de 6% para a economia do país. Todavia, se comprovada a estimativa da Standard & Poor’s de queda de 1,2 pontos percentuais dessa taxa, o PIB do país ficará abaixo de 5% pela primeira vez desde 1990.
Até agora a doença não tem cura, no entanto, laboratórios ao redor do mundo estão trabalhando em colaboração no desenvolvimento de uma vacina para o COVID-19. Em uma perspectiva mais otimista, vale lembrar que nos últimos anos a medicina tem avançado a passos largos, o que nos faz crer que, muito em breve, teremos um medicamento para a contenção dessa moléstia. Todavia, até que isso aconteça, o que nos resta é esperar até que a epidemia se estabilize e que os mercados voltem ao ritmo normal.